Estou sentada com você ao meu lado. A sua mão segurando a minha me parece ser nesse segundo a unica coisa que realmente faz o mundo girar. Olho para as nossas mãos e quero uma página branca de Word pra escrever "o modo como você segura a minha mão faz o mundo inteiro girar."
Está ficando tarde e eu tenho que ir embora. Amanha é outro dia e eu recomeço do zero. Combinei comigo mesma que esse ano vai ser diferente, vou escrever sobre outras coisas e não mais sobre essa única coisa sobre a qual eu escrevo.
Chega um carro e estaciona perto do nosso. A música alta que se confundia com a do nosso carro.
E eu tento desfocar do seu rosto e foco no carro. Não quero mais a página em branco do Word. A verdade, meu querido, é que estou cagando para o carro e para a música. Você com suas mãos e com seu sorriso largo demais para o charme de maldade que você tenta impor. Você com esses olhos. Você com esse cheiro bom. O que é que você ta fazendo comigo? O que é isso que me da vontade do mundo parar agora para eu ficar aqui conversando com você o resto da vida? O que é isso que me da vontade de ficar abraçada com você o tempo todo?
Olhando para o carro com a música alta, Clarice faria um lindo texto sobre a solidão humana ou sobre o fim da vida ou sobre amizade sem palavras. Os barbudos melancólicos eternamente tentando inventar um novo jeito de ser antigo. Os barbudos melancólicos do Mercearia fariam um texto sobre essas pessoas trepando no carro, sobre a tentativa de não se vender ao sistema e contemplar a vida no meio do nada. Eles fariam esse texto e se celebrariam e se publicariam e se premiariam. E eles são escritores respeitados. Eu sou apenas a garota angustiada, de cabeça metralhadora, de maxilares travados de tanto que dói gostar tanto de tudo. Eu sou apenas uma garota que tenta ser amada. E sou amada profundamente por algumas horas ate a hora de ir embora.
Eu me pergunto se eu não devia lobotomizar o meu cérebro pra pensar menos, lobotomizar meu coração pra sentir menos, lobotomizar meu espírito pra estar agora menos obcecada por esse seu sorriso de lado.
E então eu falaria pouco e estaria em cima das apostilas estudando ao invés de estar abaixo das estrelas com você me abraçando. Ou que eu começasse então a escrever sobre o carro e a música. Quem quer bancar a menina que escreve sobre suores e sorrisos e cheiros?
Agora você penteia o cabelo pra trás e vai pegar mais bebida. Antes, você se esbarra inteiro no meu corpo, só pra me atordoar e só porque é bem legal ter uma garota como eu prestando tanta atenção em você.
Você se afasta um pouco e eu fico pirando em toda a sua beleza que flutua pelo mundo como uma música impossivel de tirar do repeat.
E eu jamais poderia escrever sobre o carro e a música, até porque eles desapareceram e eu nem percebi.
Agora estou em casa, troquei de roupa e fiquei lutando contra os pensamento que lutavam em vir.
Estou bebada, casanda, eufórica e a nestalgia toma conta de mim.
Não sei quanto isso vai durar, e sei que isso provavel não passe de hoje, mas mesmo assim não consico tirar a lembrança do seu beijo, do seu toque, do seu perfume da minha cabeça. Isso é loucura, eu sei. E também sei que vai passar mais rápido do que eu possa imaginar, mas vou tentar curtir isso do meu jeito antes que termine, o que tiver de ser será.
Amanha eu irei viajar e provavelmente você não se lembrará mais de mim, mas quando estávamos juntos eu olhei pra lua e por um segundo tive a impressão de que ela sorria.