domingo, 18 de setembro de 2011

Então sigo assim, penso em você, sorrio (...) Peço a Deus pra cuidar da gente. -Caio Fernando Abreu

Alguma coisa deu errado em mim, e eu não sei te explicar e não sei como arrumar e nem sei se tem ajuda pra isso. Mas meu corpo inteiro se revolta quando gosto de alguém. Me armo toda pra correr pra bem longe e lutar com unhas gigantes quem tenta impedir. Me mata perceber como é ridículo ficar com saudades de você ir tomar banho. Ter que sentir ciúmes ou mágoa ou solidão e sorrir pra não ser louca. Eu sinto de um tamanho que eu não tenho e então começo a adoecer, como sempre. Eu não sou louca, eu só não tenho pele pra proteger e quando você toca em mim eu sinto seus dedos e olhos e salivas deslizando por todos os meus órgãos. E você não precisa entender o medo que isso dá, mas talvez um dia possa ter carinho.
Faço listas a 17 anos pra nunca esquecer de como queria ser pra mim, nunca conseguindo exactamente, e agora, seria pra outro? Mas ainda não deu tempo, entende? To quase ficando reta, mas ainda olho assustada meus pés. Ainda arqueada, ainda redonda. Não posso amar de pé mas não existe amor sem coragem, entende? Então não queira que eu te receba de cabeça erguida, pra te pesar sem deixar cair, sem essa dor enorme no pescoço. Meu peito ainda é semi circulo em busca de se fechar em si e em busca de não se fechar em si, então, talvez, seu soco me coloque no lugar mas, mais provável, sua mão saia do outro lado e nunca mais eu possa.
Há 17 anos o medo de se perder e doer e a obrigação de se perder pra não doer? O que é que dói afinal? Novas listas ou apertar as linhas da própria lista pra caber? O que são duas pessoas?
(...)
Fico te olhando dormindo do meu lado tão lindo com toda sua magreza e toda sua altura, e eu amo tanto tudo isso que dói tanto que acaba não doendo mais, como toda dor que de tão grande produz anestesia própria.
Como você é lindo pelado, suado, ofegante. Você é lindo quando faz amor! E que lindo é te ver todo empolgado me ensinando coisas que eu já sabia mas finjo que não sei só pra você se achar inteligente.
Você me transformou no eufemismo de mim mesma, suavizou meu soco, amoleceu minha marcha e transformou minha dureza em dança. Você quebrou minhas pernas, tirou as pedras da minha mão.
Limpei minhas mensagens, eu deletei meus emails, eu matei meus recados, eu estraguei minhas esperas, eu arregacei minhas mangas e deixei morrer quem estava em baixo delas. Eu risquei de vez as opções do meu caderninho, eu espremi a água escura do meu coração e ele se inchou de ar limpo, como uma esponja.
E eu queria assinar um contrato com Deus: se eu nunca mais olhar para homem nenhum no mundo, será que ele deixa você ficar comigo pra sempre?
Eu, que sempre quis desfilar com minha alegria pra provar ao mundo que eu era feliz, só quero me esconder de tudo ao seu lado. É engraçado como eu não sei dizer o que eu quero fazer porque nada me parece mais divertido do que simplesmente estar fazendo, ainda que a gente não esteja fazendo nada. E quando eu não sei mais o que sentir por você, eu respiro fundo perto da sua nuca, e começo a querer coisas que eu nem sabia que existiam.
E eu lembro quando a gente foi ver as estrelas e a lua, e a gente ficou deitados no capo do seu carro abraçados, e eu senti um daqueles segundos da eternidade que tanto assustam o meu coração acostumado com a fugacidade segura dos sentimentos superficiais.
Eu olhei pra você com seu óculos que te deixa com cara de inteligente e responsável e me senti tão ao lado de um homem, que eu tive vontade de ser a melhor mulher do mundo. Eu tive vontade de fazer ginástica, ler, ouvir todas as músicas legais do mundo, aprender a cozinhar, arrumar seu quarto, escrever um texto, ser mãe.
Olhei pra bem longe, muito além da caixinha de papelão com furinhos e deixei meu passado ir embora através dela.
Eu te engoli e você é tão grande pra mim que eu dedico cada segundo do meu dia em te digerir. E eu não tenho mais fome, e eu tenho que ter fome porque eu não quero você namorando uma magrela.

Sabe aquilo que dizem sobre o que é pra ser? Simplesmente fomos e continuamos sendo. Quem diria que um dia eu seria tão feliz a ponto de não contar ou reduzir sensações a palavras? Mas é isso, sou feliz com você. Sem esforço e mesmo sendo, muitas vezes, bem infeliz. Sou feliz. E me descubro ainda mais feliz a cada pedaço seu e de tudo o que é seu.
Não preciso disfarçar que não paro mais de rir, mas ai olho pra você e você também está sempre rindo. Se isso não for o motivo pra gente nascer, já não entendo mais nada desse mundo.
As vezes você é tão bobo, e me faz sentir tão boba, que eu tenho pena de como o mundo era bobo antes da gente se conhecer.
E eu tento, ainda refém de algumas células pessimistas que vez ou outra me invadem, tentar achar defeito na gente, tentar estragar tudo com uma sujeira. Mas você me deu preguiça da velha tática de fuga, você me fez dormir ao seu lado e quando eu acordei o mundo inteiro estava azul.

Eu escrevo esse texto na mente enquanto tomo banho. Daqui a pouco a gente se encontra e decide o que faz o resto do dia.